27 de fevereiro de 2009

"Heleno" - que o cinema imite o futebol arte

Ele teve dinheiro, fama e as mulheres mais desejadas do mundo em sua cama. Suas vontades eram ordens no Copacabana Palace, o hotel de sempre dos chiques e endinheirados no Rio de Janeiro. Era advogado e falava fluentemente português, inglês, espanhol e alemão. Seus ternos – de cortes impecáveis, por sinal – tinham de ser feitos pelo mesmo alfaiate do presidente Getúlio Vargas. Foi o primeiro homem a romper com o amadorismo no futebol e encher os bolsos com gols no Brasil. Morreu pobre aos 39 anos. Torrou a fortuna em bordéis e farras ao mesmo tempo em que a sífilis devorava o seu cérebro. O sujeito em questão é Heleno de Freitas, místico e mítico atacante do Botafogo, que também emprestou sua genialidade para a seleção brasileira, o Vasco, o América-RJ, o Boca Juniors, o Atlético Barranquilla, da Colômbia, e agora vai virar filme. Sua vida, sem dúvida, um roteiro perfeito com todos os elementos dramáticos. No entanto, fica a pergunta: José Henrique Fonseca, diretor de o premiadíssimo “O Homem do Ano”, conseguirá, finalmente, retratar o futebol brasileiro como ele merece na telona?

Para fazer “Heleno - o homem que chutava com a cabeça” um sucesso de bilheteria, José Henrique Fonseca terá no elenco Rodrigo Santoro, o ator brasileiro de maior sucesso no exterior atualmente no papel principal. Contra si, ele terá a má vontade do público, que recentemente viu a vida dos dois maiores jogadores da história do país se transformar em fiasco na telona. Em “Pelé Eterno”, obra que consumiu R$ 6 milhões, Anibal Massaini Neto ficou preocupado em falar das glórias do rei, repetidas à exaustão em qualquer programa de esporte e que todos estão cansados de saber. Falta de criatividade é igual a cadeiras vazias nas salas de exibição e DVD´s encalhados nas locadoras. Baseado no excelente livro “Estrela Solitária”, o filme “Garrincha”, de Milton Alencar, chuta para escanteio a história de outro atormentado ídolo botafoguense. Com atuações desastradas de André Gonçalves e Taís Araújo, o filme está na lista daqueles que NÃO devem ser vistos. Sobram chavões, casos batidos, uma edição mal feita e o telespectador fica com a sensação de já ter visto aquilo em algum lugar com uma produção melhor.

Além de Rodrigo Santoro, José Henrique Fonseca tem um trunfo importante. O filme é baseado em “Nunca Houve um Homem como Heleno”, biografia escrita pelo jornalista carioca Marcos Eduardo Neves. No livro, é possível esmiuçar a vida de Heleno desde o nascimento em São João Nepomuceno, na Zona da Mata de Minas Gerais, em 1920. Com a morte precoce do patriarca da família Freitas, em 28, a família se muda para o Rio de Janeiro, então capital da República. Heleno nasce de novo. Lá, começa a jogar futebol de praia, conhece João Saldanha, tem uma rápida passagem pelo juvenil do Fluminense e surge no Botafogo. Tendo o futebol como pano de fundo, Heleno vira personagem da vida do Rio de Janeiro. Ganha – muito – dinheiro com o futebol. Fica milionário. Desponta o primeiro astro do futebol brasileiro. Tamanho prestígio abre as portas das mais badaladas casas de shows, quartos de mulheres e dos vícios. Dentro de campo, o gênio intempestivo e brigão rende a simpatia dos botafoguenses. Cada tapa na cara de um beque inimigo é comemorado nas arquibancadas.

Em uma época em que a mídia engatinhava, Heleno, que é primo do atual diretor de futebol do Atlético, Bebeto de Freitas, era um personagem e tanto para rádios e jornais. Fazia gols aos montes – é o quarto maior artilheiro da história do Botafogo com 209 gols em 235 partidas, mas supera Quarentinha, Carvalho Leite e Garrincha na média – e provocava polêmica. Não tinha vergonha de dizer que preferia uma noitada a um treinamento. A partir da metade da década de 40, o comportamento intempestivo começa a despertar nos familiares a suspeita de que Heleno pode estar doente. Que a excentricidade, de fato, é uma perversidade mental. Por ironia, jamais levantou um caneco com a camisa alvinegra. As saídas noturnas o apresentam ao vício em éter. A falta de títulos, as noitadas, as brigas até com companheiros de time mandam-no embora do Botafogo. Tenta recomeçar em vão no Boca Junior, no Atlético de Barranquilla, no Vasco e no América-RJ. Uma desavença com o técnico Flávio Costa, em São Januário, por sinal, o impediu de sair na foto do título carioca de 1949. E pior, fez o treinador riscar Heleno do grupo que perdeu a Copa de 1950, no Brasil.

Com pouco mais de 30 anos e a vida pessoal comprometida, a família constatou que Heleno estava demente. Diagnosticado como esquizofrênico, não lembrava o homem de cabelos impecavelmente penteados e que tinha mulheres se atirando ao seu colo. Entre 50 e 54, sofre com choques elétricos e internações mal-sucedidas. O personagem Heleno tinha acabado. Em 54, o irmão Heraldo o interna em uma Casa de Saúde em Barbacena. Os psiquiatras finalmente descobrem que Heleno era sifilítico, seguramente contaminado por uma de suas dezenas de amantes. Tinha os nervos comprometidos. Por quatro anos, ele morou no hospício. Em 59, sozinho em um quarto do Hospital São Sebastião, aos 39 anos, põe fim ao seu martírio. Na cama, um cadáver raquítico, com pouco mais de 40 quilos, não lembrava nem de longe o galã goleador das multidões.

Caberá ao diretor José Henrique Fonseca a difícil tarefa de condensar em cerca de uma hora e meia uma das páginas mais dramáticas do futebol brasileiro. Nos Estados Unidos, Hollywood já provou que a combinação entre esporte e cinema é sucesso. Do beisebol, o rebatedor Babe Ruthe, de tragédia similar a de Heleno nos anos 30, voltou a emocionar o público com a interpretação de John Goodman. “Carruagens de Fogo” narra a saga de dois atletas britânicos e arrebatou o Oscar de 81 como melhor filme. Michael Jordan quebrou recordes de bilheteria com o insosso “Space Jam” contracenando com Pernalonga, Patolino e mais alguns vilões de desenho animado.

Com “Heleno”, o cinema nacional terá a grande chance de ter seu primeiro sucesso com uma história nascida dentro de um estádio e que moldou um personagem da sociedade carioca dos anos 40 e 50. Mas fica a torcida para que a película seja feita sem os vícios e os erros de projetos que tinham tudo para dar certo, mas ficaram no meio do caminho. Sem dúvida, o enredo, os personagens, os atores e o drama deixam no ar a expectativa de um filme capaz de lotar os cinemas, agradando quem gosta e quem não gosta de bola. É hora de cruzar os dedos para que o futebol brasileiro finalmente marque um golaço que possa ser visto na telona.

Pedro Blank é jornalista freelancer

2 comentários:

  1. eu sou joao batista do bairro confisco assisto o programa todos os domingos quero agradecer os perrelas por ter levado magrao e camilo. E criticar adiretoria do por deixar mostrar as imagens do jogo, pbens pelo prog.

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  2. Como identificar o nome do filme, como esta registrado no ministerio da cultura se ele será produzido apoado pela Lei Vuarnet.

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