19 de junho de 2009

Minas


Sempre admirei meu pai por um tanto de coisas. Imagino que a maioria de nós poderia dizer o mesmo do próprio pai. Mas um aspecto do jeito dele sempre me deixou meio reflexivo. Meu pai torce por Minas quando o assunto é futebol – provavelmente por outras razões também, pois é muito cioso desses modos dos mineiros: conversar para saber como o outro pensa, admirar Juscelino Kubitschek, sentir-se em casa entre as montanhas, cultivar silêncios...

Mas ele, atleticano roxo, torce para o Cruzeiro quando o que está em jogo é a bandeira branca, com o triângulo vermelho, que não lembra o governo da hora, mas os Inconfidentes e a máxima de que o ar de Minas destila sedições.

Ontem, quando o Cruzeiro despachou o São Paulo no Morumbi, com direito ao baile, com um golaço do Henrique e outro, de praxe, do Kléber, ele ficou feliz. Minas tinha mostrado para São Paulo que as montanhas têm seus guerreiros e que é sempre bom uma dose honesta de prudência quando se desafia este povo de alma larga.

Fiquei pensando, atleticano roxo, que seria bom ver a camisa alvinegra num jogo de Libertadores colocando o São Paulo na roda na casa dele. Colocando o poder econômico na roda. Colocando os títulos da editoria de Esportes da Folha de S.Paulo na roda. Colocando o olhar do Brasil nas Minas Gerais.

(...)

O bar ao alcance dos ouvidos transbordava em alegria e festa. Buzinas, gritos, barulho. O Cruzeiro fez 2 a 0 sobre esse pretenso Real Madrid doméstico que é o São Paulo. O time celeste, de um azul que reflete o céu do outono quando fenece, fez o seu papel. Minas está aí.

Para os atleticanos, fica o sonho de seguir esses passos. Passos que o alvinegro já soube dar com igual brio. Como anda fazendo no Brasileiro. E tomara que continue.

Aí volto a pensar no meu pai. Feliz, feliz mesmo, não digo que ele fique com a vitória do time celeste. Mas fica orgulhoso de Minas. Fica satisfeito em saber-se parte dessa terra que marca com princípios os rumos da história nacional. Com arte, com o reconhecimento de que o ouro que abandonou nossa geografia se depositou para sempre nos nossos valores mais caros. Como os que repousam na bandeira. Como o de liberdade.

Parabéns, Cruzeiro. O último semifinalista a Libertadores tem pela frente outro povo que sabe lutar. Os corações de Minas, apesar da diferença das cores, devem estar com o time da Toca no próximo confronto.

E toda essa harmonia, que algum anjo insolente me fez enxergar, vai se desfazer como um castelo de cartas quando nos encontrarmos de novo dentro das quatro linhas. Aí é hora de resolver em casa afetos que não se encerram.

Alexandre Freire é jornalista
PS: Feliz aniversário para o João Paulo, produtor do Meio de Campo

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