3 de setembro de 2009
A falta que faz um gol de honra
Nas peladas do bairro Santo Agostinho, numa época em que lá havia terrenos baldios e as calçadas também se transformavam em arenas à noite, iluminadas pelas lâmpadas de mercúrio e livres dos males que viriam mais tarde sob o nome de violência urbana, gol de honra era coisa séria.
Havia placares elásticos porque craques da rua desequilibravam vez por outra. Mas o time perdedor esfolava quantos joelhos fossem e seus atletas se arriscavam e duras reprimendas de volta em casa pelo estado lamentável da roupa. E “chutar bola”, como falava dona Eusa, com sapato de escola porque seu time precisava de você?
O gol de honra é apenas isso: um gol que mostra que o perdedor conserva a dignidade na derrota. Um moleque daquele tempo perdia a partida, o rumo de casa, às vezes até um amigo por escolher mal as palavras numa discussão sobre interpretação em arbitragem. Mas, o certo é que com o gol de honra, o vencido seguia com a alma em paz para o chuveiro que avivaria os ardores da pele lanhada.
Na partida há pouco encerrada entre Internacional e Atlético (jogo da 17ª rodada adiado), faltou o gol de honra. Com outras faltas, a torcida sofrida do Galo já se acostumou, ainda que contra a vontade.
Como dizia o Arlindo, pintor de paredes da minha infância, “a gente se acostuma não é só ao que é bom não”. Disse essa frase com a pele parda coberta de tinta, do alto de uma escada. Menino que assistia curioso ao trabalho de artesão, guardei-a pela intuição de que continha ensinamentos que fariam sentido mais tarde.
...
A massa do Galo está habituada à falta de talento que amaldiçoa o time desde que Reinaldo Lima teve decretado o fim de uma carreira brilhante pela combinação da covardia dos adversários, da ganância dos cartolas e da truculência do regime militar.
A massa também acostumou-se à falta de compromisso e empenho de barcas de jogadores; ao desconhecimento dos valores que um dia deram ao Galo um lugar de destaque “no cenário esportivo mundial”.
Ver o alvinegro na roda no segundo tempo, no Beira-Rio, como se fosse um pouco mais que um timinho é dolorido. Saber que o primeiro campeão brasileiro é motivo de chacota há algum tempo entre quantos torcedores ostentam mais estrelas amarelas no peito também é desconfortável. Mas inaceitável mesmo é ter um time vestindo a camisa alvinegra de Lourdes que seja incapaz do gol de honra. Pois é disso que se trata. De honra.
Faltou muita coisa ao Galo diante do Inter, merecedor inquestionável do título de campeão do primeiro turno e desde já favorito a levantar o troféu no fim do ano. Uma só coisa não dá para perdoar: a falta do gol de honra – se não pelo resultado, pelo hino, pela camisa, pela torcida. Pelas coisas que ficam.
Alexandre Freire
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O Inter tem um ótimo elenco e é sempre complicado jogar lá. O Inter pra mim é o melhor time do Brasil.
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